Contribuição e texto completo em: air0tiv
Nós enquanto anarquistas precisamos considerar seriamente o veganismo e trazer pra pauta do dia o debate sobre a libertação animal e a luta antiespecista.
O anarquismo é a teoria política que se opõe a toda e qualquer forma de opressão e hierarquia não justificada, ou seja, aquela que se exerce unicamente por quem tem mais poder, e tem como um de seus pressupostos a luta pela destruição do sistema capitalista.
Considerando o tripé de opressões do capitalismo, sendo elas as opressões de raça, sexo e classe, vejo a enorme necessidade de se pautar também o especismo.
Especismo é a atribuição de valor baseada na espécie, ou seja, tanto em relação a diferença entre animais humanos e não-humanos, justificada por uma falsa ideia de superioridade humana, enraizada pelo antropocentrismo, quanto a diferenciação de valor entre os próprios animais não-humanos, como cães e vacas, decorrentes de um simbolismo afetivo cultural e socialmente construído. Sendo assim, justifica-se por exemplo o abate massivo de vacas e porcos enquanto abomina-se, em maioria, maus tratos cometidos contra um cachorro.
Considerando que o principal beneficiário dessa exploração, ou seja, o agronegócio, é uma das bases do capitalismo, e aí podemos olhar para nosso próprio país como exemplo, com a bancada latifundiária e a exploração que esta promove, é extremamente necessário que a luta contra o especismo seja considerada e, mais ainda, que seja imediata.
Como levantar a bandeira pela libertação de todos e todas e fechar os olhos para o massacre de animais não-humanos? E com massacre eu quero dizer massacre mesmo. Só no Brasil, por ano, são mortos mais de 30 milhões de bovinos, 46 milhões de porcos e 6 bilhões de frangos. Isso sem considerar as atrocidades cometidas pela indústria de laticínios e granjas; da indústria farmacêutica e de cosméticos com as vivissecções, a indústria do couro e do entretenimento, como circos, rodeios e zoológicos.
Acredito que o rechaço de muitos e muitas em relação a libertação animal esteja ligado, não à falta de argumentos suficientes e válidos trazidos pela luta antiespecista, mas sim aos condicionantes culturais e sociais sob os quais somos bombardeados diariamente, desde nosso nascimento.
Entretanto, não devemos deixar que isso sirva de motivo para continuar ignorando a gravidade e os malefícios do especismo, assim como suas consequências.
Sabemos que todas as estruturas opressoras nos são empurradas dessa mesma forma, plantadas em nosso subconsciente pelo sistema capitalista e reforçadas diariamente através da cultura e da própria sociedade, mas que ainda assim devemos lutar contra essas estruturas, tal como a luta antirracista, antipatriarcal e de classe, as quais já nos são evidentes há muito tempo que devem ser combatidas hoje e agora, e não num futuro posterior, e assim deve ser nossa visão perante a luta antiespecista.
A luta pela libertação animal é também a luta contra a autoridade, contra as prisões, contra a escravidão, contra a repressão, a dominação e a mercantilização da vida. Mas é também a luta contra a exploração das mulheres, contra o racismo e contra a opressão da classe trabalhadora. Mas esses pontos — e suas conexões — ficam para próximos textos.
O anarquismo, por sua própria essência, não se firma sobre verdades cristalizadas e desconexas da realidade e contextos nos quais está inserido e, assim sendo, está em constante debate e aprimoramento, nunca encerrado em si mesmo. Por isso reforço: nós, enquanto anarquistas, principalmente, PRECISAMOS começar a considerar a luta pela libertação animal, precisamos inseri-la em nossas pautas, em nossos estudos, em nossos posicionamentos e em nosso dia-a-dia.
Nenhum animal (humano) será plenamente livre enquanto outros (não-humanos) forem mortos aos milhares diariamente por esse sistema brutal — que também nos dizima — chamado capitalismo.
A luta pela libertação animal é uma luta anticapitalista e precisa ser vista como tal.
Não é um adereço, não é uma “pauta secundária”. O veganismo NÃO É uma escolha pessoal e muito menos uma dieta, ou até o que alguns desonestamente chamam de “ideal pequeno burguês” (as ressalvas sobre o tal “veganismo elitista liberal” que tanto está na moda e os “críticos” (ou seria acomodados?) insistem em usar pra desmoralizar e deslegitimar a luta, eu trago em um próximo texto). O veganismo é a vivência e o posicionamento diário de pessoas que se levantam contra esse sistema que oprime, explora e mata tantos e tantas. Sejam eles e elas da espécie que for.
E nós, anarquistas, não podemos mais deixar isso de lado.